Habitação é a política social mais importante no município
Cidades acabam. Elas podem chegar ao fim. Detroit, nos Estados Unidos da América, tangenciou esse destino com as mudanças no setor automobilístico. Muitas pessoas me perguntam por qual razão insisto tanto no tema da moradia como uma prioridade para a gestão municipal. É a palavra “teto”, do meu mote-trinômio “TTT” (que ainda tem “trabalho” e “transporte”).
Para alguns, há temas mais urgentes a serem tratados. Educação, saúde e segurança, a princípio, chamam mais atenção, e moradia costuma ser um tema relegado a aqueles que não têm uma casa própria. Quando recebo esse tipo de questão, costumo inverter a pergunta: você acha que o acesso de uma pessoa a educação, a emprego, a saúde e a segurança é diferente de acordo com o lugar onde cada um mora?
Quando apresentados a esse ponto, geralmente as pessoas entendem que falar de moradia não significa apenas ter um teto. É ter, sobretudo, dignidade, direito à vida na cidade e inclusão. Habitação é a política social mais importante no âmbito municipal.
O cidadão que passa três ou quatro horas por dia num ônibus vermelho convive com um problema de transporte? É claro. E também tem um problema sério de moradia. São as pessoas mais pobres que são punidas pelos requisitos urbanísticos que encarecem a produção habitacional em Belo Horizonte.
O Instituto Cidades Responsivas, um núcleo de pesquisa focado em arquitetura e urbanismo, tecnologia e economia urbana, está envolvido em áreas bastante relevantes no contexto atual e publica indicadores de desempenho urbano essenciais para entender e gerir melhor o desenvolvimento de uma cidade.
Cada um desses indicadores aborda aspectos críticos da vida urbana: acesso habitacional; trabalho x local de moradia; vegetação e população. Esses indicadores poderiam ser ferramentas poderosas para as prefeituras e secretarias de política urbana, permitindo-lhes fazer ajustes informados e direcionados na política e no planejamento urbano para atender melhor às necessidades dos cidadãos e promover um desenvolvimento urbano mais responsivo e sustentável.
Isso, claro, em uma cidade com uma administração realmente interessada em entender, estudar e valorizar Belo Horizonte como deve ser valorizada. Muitas vezes, fica a impressão de que a atual gestão municipal perdeu o encanto, o brilho nos olhos ao falar da cidade, nos condenando a fazer sempre o mesmo, nivelar por baixo, dizer que sempre foi assim e que não há nada a ser feito. Não é postura de quem ama a própria cidade, e isso precisa mudar. É a postura dos medíocres. É o jeito de ser dos antiquados.
Alguns dos indicadores do Instituto Cidades Responsivas me chamaram a atenção. Um deles, o que analisa a relação entre o preço mediano dos imóveis e a renda domiciliar média, é uma métrica vital para avaliar a acessibilidade da moradia nas cidades.
Outro indicador, o de trabalho x moradia, se reflete na dinâmica do deslocamento diário de cada trabalhador. É um caso em que Belo Horizonte chama atenção como uma das piores capitais brasileiras no ranking. Aqui, a quantidade de vínculos de trabalho ativos é 30,5% maior do que o número de pessoas ocupadas no mercado formal, o que significa que as pessoas que trabalham em Belo Horizonte vivem nas bordas da cidade.
É uma situação que aumenta a demanda por transporte coletivo e não se reflete só na empregabilidade, mas também no acesso a estudo, saúde, serviços públicos de forma geral, vida social, cultura e lazer.
Uma cidade eficiente não é aquela que, às vésperas da eleição, tenta anunciar conjuntos habitacionais empilhando e estigmatizando as pessoas mais pobres em lugares para os sem-casa, como Belo Horizonte quer fazer no bairro Castelo ou no Padre Eustáquio. Alguém se lembrou de perguntar se as pessoas que vão receber essas habitações trabalham por ali? Ou acham que, como são pobres sem casa, tem que se contentar com qualquer lugar?
A oferta de moradia deve ocorrer de forma pensada pela cidade, com opções integradas, e não em guetos, mas sempre nas áreas com alta demanda de trabalho, nas áreas já com infraestrutura urbana e serviços públicos disponíveis. Isso é viver na cidade. O resto é empilhar gente, como o BNH fazia na ditadura.