Belo Horizonte tem potencial, mas precisa de ousadia
O povo de Belo Horizonte não é pior do que o de qualquer cidade no mundo e não deve se acostumar com a mediocridade. Baseado nesse raciocínio, toda vez que vejo uma lista das melhores cidades em qualquer critério, costumo sonhar em ver a nossa capital mineira por lá. Foi assim ao observar o ranking Time Out das “Ruas Mais Legais do Mundo”, uma iniciativa que destaca os espaços urbanos mais inspiradores e vibrantes ao redor do globo.
Essas ruas, eleitas por seus ambientes acolhedores, pela efervescência de suas culturas e pela harmoniosa convivência entre comércio e lazer, representam o que uma cidade pode oferecer de melhor aos seus cidadãos e visitantes. High Street, em Melbourne, na Austrália, de onde me manda notícias meu amigo Alexandre Cunha, está em primeiro lugar, com seus restaurantes épicos e sua atmosfera de camaradagem, e reflete um tipo de experiência urbana que temos aqui e que poderia também ser reconhecida.
À medida que as cidades globais competem por atenção, inovação e turismo, Belo Horizonte se destaca como candidata a ser reconhecida como uma das metrópoles mais vibrantes e culturalmente ricas do mundo. Só que isso não pode ficar apenas na vontade.
O exemplo da rua Sapucaí, que pulsa com vida e criatividade, mostra que Belo Horizonte já tem a semente para esse desenvolvimento. Espera-se que a reforma prevista para o espaço se concretize de forma a melhor esse potencial, como sempre defendi – e acrescento que o desenho deveria seguir pela rua Itambé.
Na via Albuquerque, um trecho da rua Antônio de Albuquerque, na Savassi, já começamos a ver o potencial de Belo Horizonte. Ali, a Livraria da Rua, uma das minhas favoritas, expande suas fronteiras aos fins de semana, transformando o espaço em uma zona de celebração cultural, com música, comida e diversão; uma rua onde a cultura local e o lazer se encontram para celebrar a vida na cidade. Eventos assim exemplificam a possibilidade de um espaço urbano que ressoe com a comunidade local e atraia visitantes de todos os cantos.
É fundamental conjugar o desenvolvimento cultural com o respeito ao sossego dos moradores. A promoção de uma vida urbana vibrante não precisa excluir a tranquilidade residencial. Isso significa regulamentações pensadas, infraestrutura adequada e, acima de tudo, um diálogo constante com a comunidade. A cultura deve ser uma ponte, não um muro que separa ou isola.
Belo Horizonte já mostrou que consegue fazer ruas legais, mas merece mais ousadia. Um bom exemplo de ousadia na história da cidade é o prefeito Juscelino Kubitschek, que rejeitou a mediocridade e ousou no projeto da lagoa da Pampulha. A lagoa que vemos hoje é uma bacia de sujeira que não combina com o que JK sonhou, e, como já disse várias vezes, tenho como sonho e objetivo ver a Pampulha limpa. E a orla?
Ao longo da avenida Otacílio Negrão de Lima, também é possível sonhar.
Por lá, imagino um calçadão pulsante de atividades culturais, onde belo-horizontinos e visitantes possam se reunir para experimentar a essência de nossa cidade. É assim nas orlas ao redor do mundo. Quiosques, esportes, comida, bebida, vida urbana. Hoje, a orla não tem opções de lazer, conta com no máximo alguns vendedores ambulantes. Sequer há banheiro. Como valorizar esse ativo turístico, patrimônio da humanidade, desse jeito? Os imóveis na via deveriam contar com normas que permitissem sua transformação em bares, restaurantes e lojas.
O trânsito deveria ser removido para a via anterior. Como a High Street, em Melbourne, sonho com um espaço onde os estabelecimentos comerciais façam da rua um grande encontro cívico, ecoando a alegria de nossas tradições e a inovação de nosso povo criativo. A Pampulha está malcuidada, mas tem potencial. Tenho convicção de que conseguimos fazer algo mais legal e mais bonito do que a Austrália.
Minha proposta é um convite: que cada morador se veja como protagonista da renovação de Belo Horizonte. As calçadas das ruas não são apenas caminhos que percorremos; elas são o palco onde a vida acontece, onde nossa identidade é expressa e celebrada. A verdadeira transformação virá de todos nós, juntos. Vamos tornar Belo Horizonte um exemplo de inovação urbana, uma cidade que ressoa com a alma mineira e a vibração de um futuro promissor. Precisamos refletir: em que momento passamos a achar normal o nosso principal ponto turístico estar fedendo? E o que nos impede de sonhar em estar na lista dos mais legais do mundo?