Lula quer pobres nos carros; eu quero todos no ônibus

Investir em transporte individual é erro do presidente

Verdade seja dita: o presidente da República Federativa do Brasil está errando demais. Governa como se tivesse vencido as eleições com larga vantagem. Não! Vale recordar… A diferença se deu por 2.139.645 votos, menos gente do que todas as pessoas que vivem em Belo Horizonte, uma cidade que não suporta mais automóveis.

Reduzir cidadãos a consumidores é uma das características do populismo. Falar em cerveja e picanha é mais simples do que traduzir a importância de reduzir o endividamento familiar. 

Quando entramos na pauta urbana, nada pode ser mais canalha do que estimular o Brasil a consumir mais veículos individuais. Assim, Lula, você ajuda a destruir nossos municípios.

Erros repetidos

Trata-se de um erro histórico, que Juscelino Kubitschek também cometeu: impulsionar o transporte individual automotivo. Na primeira reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social Sustentável, o “Conselhão”, se ouviu que “um carro de R$ 90 mil não é popular”. De fato, não é. É caro, e nisso o presidente da República Federativa do Brasil tem razão.

O que veio a seguir, entretanto, é preocupante. A declaração se seguiu a integrantes do governo estabelecendo como meta o desenvolvimento de automóveis mais simples e com menos itens tecnológicos, que custem até R$ 50 mil. Em nenhum momento vi declarações de integrantes do governo falando em abertura de mercado, eficiência e produtividade. Mobilidade urbana então…

Pelo contrário, a meta parece ser a de colocar veículos com menos recursos no mercado e continuar a entupir de maneira irresponsável a indústria automotiva de subsídios. Mais? Com subsídios pontuais, veículos piores com dinheiro público financiando um pedaço e sem reformas estruturais, podemos até ter um carro mais barato na etiqueta, mas qual será o custo disso para o pagador de imposto? E o impacto urbano?

Problema urbano

Toda vez que esse assunto surge, as mídias sociais resgatam um vídeo de 2016 do economista Marcos Lisboa, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda no primeiro governo Lula.

Em palestra, há quase sete anos, Marcos Lisboa classificou a indústria automotiva como o setor econômico mais protegido da nação, que apoiou políticas de fechamento de mercado e controle cambial, que afastaram importações e acabaram estimulando, obviamente, uma produção menos eficiente e mais cara. Infelizmente, essa avaliação segue atual.

Depois de interferir no mercado e deixar os veículos com valores mais elevados, como grande legado do Inovar-Auto, agora o governo quer interferir outra vez para reduzir os recursos tecnológicos dos carros e usar dinheiro público para subsidiar uma indústria já ineficiente. E o que isso significa para nossas cidades?

O mundo inteiro está constatando de maneira muito óbvia que o modelo de transporte individual, que atingiu seu auge nos Estados Unidos da América, acaba incentivando cidades menos densas, perda de valorosos espaços urbanos para estacionamento, poluição urbana e inevitáveis engarrafamentos que não são superados nem com a construção de mais faixas de rolamento.

Com um transporte público caro e sem qualidade, o cidadão é estimulado a consumir o automóvel mais barato que conseguir, o mais cedo que puder. Por vezes, compram-se motocicletas, que abarrotam nossos hospitais com acidentados. Dependendo do deslocamento, a passagem de ônibus durante o mês já é mais cara que a parcela da moto.

Não é razoável, claro, esperar que o cidadão abra mão do seu conforto individual em nome de um ideal de cidade, embora haja quem o faça… Em geral, cada um procura o que é melhor para si. Na hora de formular políticas públicas, claro, o assunto é diferente. Investir recursos públicos para subsidiar a indústria de automóveis é um erro. O dinheiro público deve ser usado para melhorar o transporte público.

O governo federal desiste do transporte coletivo quando fala em colocar os mais pobres em carros. Eu quero que os ricos estejam no ônibus. No metrô (enfim concedido) também. Se a classe alta brasileira acha o máximo caminhar pela Avenue des Champs-Élysées, em Paris, além de utilizar ônibus vermelho de dois andares e postar fotos do “Mind The Gap” no metrô de Londres, por que não investir para termos o mesmo aqui? 

O carro é cafona. Depender dele é um vício (que mata), do qual nossa sociedade precisa se livrar.

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