Sem federalismo, não haveria Belo Horizonte

A autonomia estadual viabilizou uma capital moderna, planejada e republicana. A cidade nasceu como obra da descentralização

Em 12 de dezembro de 1897, Belo Horizonte foi inaugurada como símbolo urbano de um país que se reinventara.O Brasil, recém república, adotara em 1891 seu primeiro texto constitucional federativo, inspirado no modelo americano, concedendo autonomia administrativa, financeira e política aos estados. Esse gesto rompeu o centralismo imperial e abriu espaço para experiências locais modernas.

A nova ordem permitiu que Minas Gerais sonhasse sua própria capital. A Constituição estadual de 1891 autorizou a mudança da sede do governo. Ouro Preto, presa ao relevo, não comportava o avanço populacional e técnico do período republicano. Minas optou por uma cidade nova, expressão de autonomia e trabalho.

Em 1893, a Lei Estadual 3 determinou a construção da Cidade de Minas no Arraial do Belo Horizonte. Aarão Reis, engenheiro paraense formado na Escola Politécnica do Rio de Janeiro, recebeu a missão de projetá-la. Criou uma malha ortogonal influenciada por centros internacionais, combinando ciência, técnica e visão institucional.

O projeto previa dois espaços cívicos centrais: a Praça da Federação, atual Carlos Chagas, e a Praça da República, atual Afonso Arinos. A avenida Álvares Cabral conectava simbolicamente forma de Estado e forma de governo.Belo Horizonte nasceu com esse eixo estatal inscrito na planta. A denominação se perdeu, porém a ideia segue evidente: a cidade é manifestação urbana do federalismo.

Os edifícios públicos foram distribuídos com intenção e racionalidade, representando a autonomia como fundamento. Belo Horizonte foi a primeira capital brasileira planejada para expressar a independência dos poderes estaduais e a força institucional.

O ideal federativo que moldou sua criação tem raízes profundas. Enquanto as colônias britânicas criavam seu modelo de federação, os inconfidentes mineiros dialogavam com os revolucionários americanos. O espírito de liberdade de Cláudio Manuel da Costa e Tomás Antônio Gonzaga dialogava com Jefferson e Madison. Um século depois, esse horizonte se materializou na nova capital.

Sem o federalismo de 1891, Belo Horizonte não existiria. A autonomia estadual viabilizou uma capital moderna, planejada e republicana. A cidade nasceu como obra da descentralização e testemunho da confiança nas instituições locais.

Cento e vinte e oito anos depois, o desafio persiste. A concentração de decisões, poder e recursos em Brasília fragiliza estados e municípios. O federalismo de dependência reduz vitalidade urbana e eficácia democrática. Em Minas Gerais, a distorção é clara: mais de 700 municípios não arrecadam sequer 20% do que gastam e quase 90% dependem do FPM. O estado que já foi locomotiva nacional detém hoje menos de 10% da receita do país.

O livro “Federalismo!”, que escrevi com o professor Onofre Alves Batista Júnior, surge desse diagnóstico. Analisa crises, origens e teorias do federalismo brasileiro. Demonstra como a concentração de competências transformou o pacto em hierarquia e apresenta caminhos de reconstrução administrativa, política e social. Com prefácio de Antonio Anastasia, é convite à reflexão e à ação.

Neste aniversário de Belo Horizonte, celebramos uma capital que é manifesto urbano e constitucional em defesa da federação. Descentralizar significa civilizar. O traçado da cidade permanece como desenho de equilíbrio, liberdade e responsabilidade.

O lançamento de “Federalismo!” será amanhã, às 11h, na Livraria da Rua, na rua Antônio de Albuquerque, 913, Savassi. É nosso presente à cidade, a Minas Gerais e ao país. Um convite a acreditar em cidades autônomas, estados capazes e uma república viva. É um grito: “Federalismo!”

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Gabriel de a a z

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