O uso da máquina pública para fazer o ex-prefeito mais feliz
A quem serve a Prefeitura de Belo Horizonte? Alexandre Kalil abandonou sua cadeira, mas agiu antes para resolver seus problemas. Por exemplo, conseguiu que o município fosse devedor solidário em um processo trabalhista de sua empresa e viu o contribuinte pagar as dívidas que a Fergikal, empresa dele, tinha com um ex-funcionário.
E a dívida de IPTU? Aquela que ele prometeu que pagaria antes de assumir. Dever não é um problema em si, todavia o que se viu foi a prefeitura atuando para atrasar a cobrança e para, ao final do mandato, simplesmente perdoar a dívida.
Sabiam que um processo foi distribuído para um endereço errado em 2019, enquanto Alexandre Kalil era prefeito? Até hoje, a prefeitura não conseguiu encontrá-lo. Ainda há a atuação da Procuradoria Geral do Município para extinguir outros.
O perdão das dívidas pouco antes da renúncia do ex-prefeito não é novidade: já foi revelado pela rádio Itatiaia e merece uma investigação. O que se seguiu após isso foi pior, mostrando que a prefeitura, agora comandada por Fuad Noman, segue servindo aos interesses de Alexandre Kalil.
Em 19.7.2022, foi publicada no portal da rádio Itatiaia uma matéria revelando que a prefeitura desistiu de cobrar dívida por IPTU de Alexandre Kalil nos últimos dias de mandato. A prefeitura foi questionada, mas não houve retorno até hoje.
Estranhamente, o ex-prefeito, favorecido pela extinção dos processos, solicitou, no dia 20.7.2022, um dia após a reportagem, manifestação sobre o mesmo caso, tendo sido respondido no mesmo dia pela prefeitura. Curiosamente, aliás, respondido com um documento novo, e não com a fundamentação original, que até hoje não se viu. Quem escreveu a resposta foi o subprocurador Luiz Gustavo Levate (conselheiro da BHTrans nomeado por Alexandre Kalil e agraciado com milhares de reais em jeton, remuneração extra além do salário pago pela prefeitura…), que atuou desde 2015 na execução e nunca encontrou qualquer valor ou bem de Alexandre Kalil para satisfazer o débito com o município. Agora, o mesmo subprocurador informou que não conseguira identificar se o imóvel era mesmo de Alexandre Kalil – mesmo que, antes de ser prefeito, ele não questionasse tal fato, chegando até mesmo a se dispor a negociar um parcelamento da dívida.
De posse das informações prontamente disponibilizadas, Alexandre Kalil resolveu acionar judicialmente o jornalista Lucas Ragazzi por suposto crime contra a honra, em manobra descrita na melhor doutrina como “assédio judicial”. Para um democrata, tem ainda outra definição: censura.
A peça contra o repórter é pública e pode ser consultada por qualquer advogado com registro no sistema PJe. Na ação, os advogados cometem um ato falho: reiteram que o repórter deveria ter consultado diretamente o subprocurador específico, dando a entender que não apenas sabiam que a prefeitura, enquanto instituição, tinha sido consultada, como sabiam que esse servidor específico poderia dar uma resposta mais favorável, como ocorreu. Um escândalo!
A legislação que regula a organização administrativa da Prefeitura de Belo Horizonte foi assinada pelo próprio Alexandre Kalil. Quem responde à imprensa é a Secretaria Municipal de Assuntos Institucionais e Comunicação Social. O repórter questionou e não recebeu nenhuma reposta. O ex-prefeito pediu e recebeu um documento sob medida.
Assim, enviei notícia de fato ao Ministério Público para que sejam apurados os crimes de advocacia administrativa e prevaricação por agentes públicos, bem como à Promotoria Eleitoral para apuração de uso de poder político evidente ao utilizar agentes públicos para satisfazer narrativas que interessam ao ex-prefeito, candidato a governador. Enquanto jornalista profissional sindicalizado, solicitei à nossa entidade em Minas Gerais que se manifeste em defesa do repórter Lucas Ragazzi, alvo de assédio judicial e censura.