Fim das grades e trazer o povo para dentro da Câmara
Urbanisticamente, não simpatizo com o traçado de Brasília, inspirada na Carta de Atenas de 1933. Desgosto dos automóveis. Gosto das calçadas. Todavia, enquanto manifesto, o Plano Piloto, seus edifícios e suas obras são um patrimônio do Brasil e do mundo, que particularmente exalto diante da ousadia de Juscelino Kubitschek em levar-nos adiante do tempo e fincar no Planalto Central a alvorada do nosso futuro.
O rascunho dessa grandiosidade inaugurada em 1960 foi traçado 20 anos antes, numa cidade que recebe um nome de Belo Horizonte, no entorno de uma lagoa que recebe o nome de Pampulha, início da arquitetura modernista brasileira.
Símbolos Importam
Em 2013, manifestações tomaram conta do Brasil. Eu era subsecretário de Juventude do Estado de Minas Gerais e vi o governador Antonio Anastasia receber pessoas no Palácio da Liberdade para dialogar. Uma delas subiu à mesa do Salão de Jantar gritando e exigindo demandas.
Num dos dias de manifestações, fui cercado por um bando de pessoas que me xingava por eu ser um… político. E, na avenida dos Andradas, no Palácio Francisco Bicalho, sede do Poder Legislativo Municipal, houve uma invasão. As paredes foram pichadas, houve tentativa de entrada no plenário para impedir parlamentares de votar e até denúncia de estupro no local se deu.
Ninguém que estava lá queria um golpe de Estado, como os que marcharam sobre Brasília em 8 de janeiro de 2023. Não. E não os estou comparando. Apenas pontuo: numa democracia, o único caminho é a política. E a política só se dá com as instituições.
Uma das causas das pessoas que invadiram a Câmara Municipal em 2013 era também uma causa minha: a mobilidade urbana. Aliás, era uma causa tão minha que, em 2016, me elegi vereador, presidi uma CPI que investigou e revelou a corrupção nos ônibus de Belo Horizonte, escrevi um projeto de lei para fechar a BHTrans e sigo fiscalizando e legislado para aprimorar o sistema de transporte coletivo na capital mineira.
É assim que se faz num Estado democrático de direito. Um cidadão não deve usar a imposição, a invasão, a violência. Nunca. Não em uma democracia.
Usando esses fatos como desculpa, três anos depois, o ex-vereador cassado Wellington Magalhães, exercendo a Presidência da Câmara Municipal de Belo Horizonte, decidiu gradear o entorno desse espaço de poder em um ato de 25 de abril de 2016. Custou R$ 94.351,17. Uma decisão errada. E, no último fim de semana, sete anos depois, ordenei que arrancassem essas grades.
A decisão já havia sido tomada logo após a posse. E, mesmo diante dos fatos assombrosos na praça dos Três Poderes, não quis recuar desse propósito. O Parlamento é o lugar onde o povo se representa numa democracia indireta. Ele não pode ser gradeado. Precisa ser aberto. E precisamos de alfabetização democrática para que todos compreendam sua importância. É preciso abrir a Câmara Municipal.
É também para educar o povo que. diante do prédio erguido em 1988, a praça hoje desfigurada será requalificada. Ela se chama praça da Constituição, onde, além de uma obra incrível de Amílcar de Castro, há um monumento que celebra nossa Lei Orgânica desenhado por Oscar Niemeyer.
É também para trazer o povo para dentro da Câmara Municipal que as portas do restaurante popular serão abertas em fevereiro de 2023 com comida boa, bonita e barata para que a fome não encontre morada na nossa cidade. A refeição custará R$ 3.
É também para fazer o povo se representar no Palácio Francisco Bicalho que as obras de Yara Tupinambá feitas para o plenário retornarão para o plenário, de onde não deveriam ter saído.
É também para encantar o povo ao visitar o Parlamento que centenas de obras guardadas nos nossos arquivos e museus serão desencaixotadas e expostas nas nossas paredes e corredores, transformando nosso espaço numa grande galeria de arte, cultura e memória (tudo obviamente seguindo critérios técnicos que não prejudiquem quaisquer acervos).
Os Parlamentos, sejam municipais, estaduais ou federais, são monumentos. Diria Winston Churchill que “nós moldamos os nossos edifícios e, depois, nossos edifícios nos moldam”. Moldemos, pois, a morada da nossa democracia municipal para a morada da nossa democracia municipal nos moldar.