Não existe um Fernando Collor na Noruega

Eu tinha poucos anos quando ouvi a expressão Casa da Dinda pela primeira vez. Nunca entendi muito de carro, mas aprendi cedo qual era o modelo Elba da Fiat. Passaram-se anos e o personagem envolvido com os dois objetos acima voltou aos jornais. A casa era a mesma, mas o carro… Eu fiquei com cara de tacho (essa expressão se usa no Brasil inteiro?) quando disse que ensinava direito constitcuional a uma norueguesa. Ela me preguntou por qual motivo eu fazia isso, se no nosso país, raramente se respeitavam as leis. Deve ser realmente difícil para os noruegues entenderem as práticas brasileiras. Escrevo esse texto em Oslo, capital do país, onde eu realmente fiquei impresionado com a civilização que existe por aqui.

O que se faz agora com as crianças é o que elas farão depois com a sociedade.

A – Pelo quinto ano consecutivo, a Noruega conseguiu foi considerada o país mais democrático do mundo, segundo o Índice de Democracia 2014 publicado pela The Economist Intelligence Unit (EIU) no dia 20 de janeiro.

BO país escandinavo obteve 9,93 pontos em uma escala de 10 pelo terceiro ano consecutivo.A presença do país no topo da lista já é mais tradição do que surpresa dentro da lista de 165 países e dois territórios que o índice contempla.

C – A Noruega conseguiu a pontuação máxima em quatro dos cinco fatores avaliados pela medição (processo eleitoral e pluralismo, liberdades civis, funcionalidade do governo, participação política e cultura política).

D – Uma dose de direito constitucional: mais uma monarquia dualista. O país tem uma história curiosa. Foi parte da Dinamarca. Foi parte da Suécia. E, quando desejou a independencia, no início do século vinte, decidiu se manter monarquia e importou um monarca. A coroa, no entanto, é um símbolo proibido. Não há coroação. Há consagração. O rei é o chefe de estado. O primeiro ministro é o chefe de governo. O ministério se encontra com a realeza todas as sextas-feiras no palácio em Oslo. O Stortinget (Parlamento) é unicameral com 169 assentos. 150 são eleitos de maneira proporcional em 19 territórios. 19 são acrescidos para igualar e garantir minorias.

E –  Há um tripé norueguês: instituições públicas fortes, uma cultura baseada na confiança e na baixa desigualdade.

F – O bom desempenho da Noruega no índice da EIU coincide com o do resto de sua região. Quatro dos cinco países mais democráticos, segundo o índice, são os nórdicos. Historicamente, o primeiro lugar da lista quase sempre ficou com um país escandinavo: a Noruega nas últimas cinco medições e a Suécia nas edições de 2006 e de 2008.

G – Todos estes países têm estados de bem-estar social que geram confiança no sistema e também nivelam as desigualdades, o que, por sua vez, gera confiança nas instituições democráticas.

H – Tudo é caro demais! As pessoas pagam muitos impostos, mas os serviços públicos possuem qualidade.

I – A Noruega é o melhor lugar do mundo para ser mãe de acordo com cinco critérios (taxa de mortalidade materna, infantil, as condições econômicas, sociais e o nível de escolaridade).

JEstá na Noruega a prisão mais humana do mundo! Halden é considerado um modelo no sistema carcerário para o mundo todo. A aposta é na recuperação e não na punição. Nessa prisão estão os criminosos mais perigosos da Noruega e mesmo assim há a preocupação de oferecer condições dignas para todos, não há superlotação e um mínimo de conforto é oferecido aos presos, o que já rendeu uma comparação a um hotel. Esse modelo que, entre outras coisas, tem guardas sem armas de fogo em certas prisões e janelas sem grades ajuda no baixo índice de reincidência, ou seja, o preso não volta a praticar crimes.

KUma das sociedades mais avançadas em igualdade de gênero no mundo! Ao menos 40% das vagas em empresas tem que ser obrigatoriamente para mulheres. Nas ruas é possível ver muito mais pais com carrinhos de bebês do que mães, os pais sabem cozinhar, arrumar a casa, as mães tem seus dias de diversão com as amigas enquanto eles ficam tomando conta da casa e filhos e vice versa. É igualdade, direitos iguais, portanto, deveres iguais.

L – Um ranking que sempre circula na internet e em revistas e no qual a Noruega figura no topo além dos de país com maior IDH do mundo, país mais próspero do mundo, país mais democrático e vários outros tem um tom mais polêmico. É que a Noruega é considerada um dos países mais ateus do mundo (ou com população atéia). Pesquisas de institutos europeus vão além e mostram análises que provam que países ateus seriam mais pacíficos. Existe um valor que está a cima de tudo isso e é muito forte: a confiança. A vida não funciona entre os noruegueses na base da desconfiança e sim da confiança e da palavra. O ônibus está ali, o usuário entra e sai sem pagar dentro, se ele tem o passe é uma questão de como ele compreende que esse sistema deve atender a todos e que se uns quebrarem esse pacto não funcionará mais, inclusive para ele. O mesmo para pertences esquecidos, bolsas deixadas sem ninguém olhando enquanto você vai ao banheiro no bar, o sistema político, os relacionamentos, as relações profissionais. A confiança tem um sentido muito forte e pode ser bem difícil de ser compreendida em um primeiro momento por alguém de fora.

M – Era nessa palavra que eu queria chegar: confiança, a base da Noruega. Como pode a população das Alagoas confiar a Fernando Collor de Mello um mandato de senador? Como? Claro, os exeplos de políticos que não gem como deveriam são inúmeros, mas creio que estamos diante de um caso emblemático. Se passaram duas décadas desde o impeachment. Eu temo que a questão brasileira é mais grave que um reforma de regras eleitorais para resolver… Enquanto houver confiança no Collor, não da para confiar no Brasil.

Compartilhe:
Gabriel de a a z

CONFIRA OUTROS ARTIGOS: