Obrigado, Bituca

Legado de Milton Nascimento para Minas e o mundo

Há uma coleção de vezes que chorei no Mineirão. E, ainda que somasse o choro dessas e de outras, penso que faltariam lágrimas para equiparar ao que aconteceu nesta semana. No último domingo, 13 de novembro de 2022, ouvi e vi Milton Nascimento na última sessão de música.

Pouco após algumas notas de “Ponta de Areia”, estrada natural que ligava Minas ao mar, um homem visivelmente emocionado fazia-me chorar pela primeira vez naquela noite: “Esse show é dedicado a minha querida amiga Gal Costa”. Catavento. Pausa para ela… 

Gal, que voz. Por isso uma força me leva a cantar, por isso essa força estranha no ar… Ela era mesmo uma força estranha. Quarenta discos em 57 anos de carreira. Da bossa nova à tropicália, chegando aos dias atuais. Eu tinha 8 anos quando ela mostrou os seios e pediu para o Brasil mostrar a sua cara. Um pedaço da brasilidade se vai. Que a gente não se esqueça do tipo de maravilha que esta terra é capaz de gerar. Seu nome é Gal.

“Morro Velho”. “Outubro”. “Amor de Índio”. “Vera Cruz”, na voz do jovem, lindo e talentoso Zé Ibarra, de 25 anos. Pai Grande. Que bom amigo. 
Subiram ao palco Beto Guedes, Lô Borges, Toninho Horta e Wagner Tiso. Todo um Clube da Esquina cantando nosso hino, nosso lema. “Para Lennon e McCartney”: sou do mundo, sou Minas Gerais! Que momento. E mais lágrimas cantando a plenos pulmões… Milton é mineiro, dado que ser mineiro não é questão de nascimento. Mineiridade é condição adquirida. E até Minas Gerais ficou mais mineira com ele. 

Não havia outro lugar no planeta, a não ser Belo Horizonte, para Milton Nascimento fazer o último show da sua carreira. Cidades se erguem também pelas belas e únicas características que possuem. Milton Nascimento é de todos, mas é mais nosso. O show também foi mérito de músicos e profissionais que garantiram um espetáculo que é uma das nossas vocações: entreter com qualidade. 

Ele também é filho de uma Maria do Carmo, como eu e tantos outros brasileiros. Lília. Nada será como antes… Imagino, sendo hoje proprietário de um bar de jazz, o que era o privilégio de ouvi-lo tocar no Bar Berimbau ou na TV Itacolomi na década de 1960. Nasci em 1986 e não estive nos festivais que ousaram em plena ditadura. No último domingo, me senti um pouco lá. E, como lá, não postei nada na internet… eu queria viver aquilo, não postar. A vida é mesmo o que se vive agora. Ela passa mesmo. É assim. Achar que capturamos momentos registrando dados em companhias do Vale do Silício é uma ilusão. Precisamos ver com os olhos, e não com a tela do telefone celular. Amemos. Qualquer maneira de amor valerá! 

“Maria, Maria”… Ele nos ensinou que é preciso ter força, é preciso ter raça, é preciso ter gana sempre. Ele nos ensinou que vale cultivar essa estranha mania de ter fé na vida. Fogos de artifício! 

Quando muitos mineiros estão juntos, pode-se chamar esse espaço de lar. Pertinho de mim estava o talentoso estilista Ronaldo Fraga, que vestiu Milton Nascimento das suas cores, com quem chorei abraçado aos pulos ouvindo a música, pois somos democratas, e esse espetáculo teve sabor democrático. Quero falar de uma coisa… a minha canção favorita: “Coração de Estudante”. 

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